E
NOS APAIXONAMOS TAMBÉM PELO OTÁRIO
Dezembro
de 2013
Grandes surpresas tive esse ano,
com assuntos ligados à Argentina. Em
primeiro lugar, foi a paixão que o papa Francisco, portenho, despertou em
milhões de brasileiros. E acabei de
descobrir que nossa balança comercial sofreria grandes alterações se
precisássemos pagar pelas palavras que “importamos” dos hermanos.
É claro que pegamos emprestadas
palavras de outros tantos idiomas, pois esse fenômeno é natural...dos escravos
africanos ficaram, por exemplo, bagunça, babaca, birita, cafuné, maracutaia,
urucubaca.
Fui
atrás de outras heranças e vi que, dos índios, fora a quantidade de palavras
que usamos todo dia, como pipoca, pereba e biboca, temos bairros, cidades e
dois estados, Sergipe e Paraíba, com nomes absorvidos. Ipanema, por exemplo, quer dizer rio sem
vida, sem sorte. Já Pavuna, quer dizer
lagoa escura. O que me assusta é saber
que os homens do século XX construíram uma usina nuclear em um lugar chamado
Itaorna, que quer dizer pedra podre. Os
guaranis, que habitaram a região, tinham mais conhecimento de assuntos sísmicos
do que nós. Descobri isso em um
congresso do qual participei na Califórnia, sobre emergências e desastres, e
fiquei chocada. Mais uma assunto que vem
para nos deixar envergonhados.
Do hebraico, temos, por exemplo,
aleluia, sábado, amém, fariseu, jubileu e maná.
Quando começa com “al”, dizemos logo que tem origem árabe. Além dessas, encontramos café, laranja,
limão, tambor, safra, garrafa. Do francês, logo me lembro do abajur, do omelete
e do menu. Do italiano, vou excluir a pizza, pois tem gente que diz que essa veio
do alemão, mas posso incluir cantina, sonata, dueto e carnaval. Não discuto sobre a origem da palavra, mas
que a pizza italiana é maravilhosa, não tenho dúvidas.
Do inglês, vieram para ficar o
coquetel, o lanche, o pulôver, se não quisermos pensar no escanear, deletar,
estartar... mas a melhor nem precisa ser traduzida – de hot dog todo mundo
entende. Quanto ao Japão, digo o
contrário, pois fomos nós que legamos a eles muitas palavras. Tempura, que tem a cara de nome japonês, tem
origem portuguesa!
Voltando aos vocábulos que vieram
da Argentina, confesso que a maioria, para mim, tinha mesmo é nascido aqui na
minha terra, que tem palmeira e onde canta o sabiá. Li sobre o assunto em uma Veja, na coluna do
J.R. Guzzo. O que mais causa espécie é que as palavras das quais nos
apropriamos não estão nos livros de Ernesto Sabato, Julio Cortázar ou de Jorge
Luiz Borges... vieram da rua, dos vigaristas, proxenetas, criminosos em geral,
passaram para as letras do tango e ultrapassaram nossas fronteiras.
A lista é enorme, e a gente fica
sem saber os motivos que nos levaram a incorporar, com tamanha facilidade e
intensidade, aquilo que não criamos e que não tem raízes nessas bandas. Barra pesada, fajuto, bacana, patota, pirado,
bronca, afanar, engrupir, embromar... e vai por aí. A que melhor se adaptou ao novo clima foi
OTÁRIO. O articulista que me inspirou pergunta se a alma brasileira apresenta uma
tendência forte para essa linguagem da marginalidade.
Guzzo acha que o carioca, por
exemplo, ouve como elogio alguém considerá-lo malandro. O brasileiro, como média, não quer ser otário,
e mesmo sendo trapaceado por muitos governantes, por alguns patrões, ainda se
considera o esperto. Acredita ele que, dessa massa de crédulos, ingênuos, que
se acham os mais malandros do planeta, aproveitam-se os vigaristas e os
políticos de péssimo caráter, sempre grande marqueteiros.
Fico na dúvida se é por ingenuidade
e credulidade que o povo se deixa ludibriar por essa gente. Quem sabe é a lei de Gerson que faz com que
muitos aceitem qualquer oferta e comprem a ilusão daqueles que se acham mais
malandros? Esse pode ser o X da questão
pois, querendo levar vantagem em tudo, são trapaceados pelos espertalhões e
acabam sendo os verdadeiros otários da história.
Na verdade, OTÁRIO mesmo é
quem não sabe olhar um céu bonito e se emocionar, quem ouviu uma linda canção
de amor e não se derreteu, ou não segurou, com firmeza, a mão da pessoa amada
quando ela apareceu na sua frente.
É por isso que, nesse início de ano,
devemos escolher um belo final de tarde para, na praia de Ipanema, seja carnaval
ou não, fazer um cafuné no nosso amor, tomando uma birita, que
pode ser uma caipirinha de limão, ou uma outra qualquer que esteja no menu,
sem esquecer de deletar o que não interessa nesse momento tão especial...
na verdade, um programinha super bacana.
E acreditando na teoria que diz que a palavra é a transliteração do
ulular como exultação da alegria própria do povo de Israel, vamos gritar, em
agradecimento a toda essa herança: Aleluia! Aleluia! Que 2014 nos
traga muitas alegrias!